Projeto de alunos sobre trabalho escravo e tráfico de pessoas em Minas Gerais transcende os muros da escola

Iniciativa foi apoiada pelo programa Escravo, nem pensar! e mobilizou mais de 450 alunos.

Quando a Escola Estadual Imperatriz Pimenta iniciou o projeto “Um novo olhar: Escravo, nem pensar”, em abril de 2015, a sua equipe pedagógica não tinha ideia de sua grandeza. Localizado na periferia de Ibirité (MG), município da região metropolitana de Belo Horizonte, o colégio atende 465 alunos do Ensino Médio e nem sempre teve a boa fama de hoje.

Segundo Denise Vitoriana, professora de Língua Portuguesa que coordena o projeto, muitos alunos do colégio já sofreram preconceito por serem de comunidades carentes, o que impactava negativamente em sua autoestima. Mas, nos últimos anos, os resultados colhidos por conta das melhorias na qualidade de ensino têm prevalecido. No último ano, a escola foi premiada pela Secretaria Regional de Educação de Minas Geras (Metropolitana B) devido à revitalização de seus muros. E o projeto realizado ao longo de 2015, com o apoio do programa Escravo, nem pensar!, só veio agregar.

“Um novo olhar: Escravo, nem pensar” foi um dos 15 selecionados pelo 9º Fundo de Apoio a Projetos do programa Escravo, nem pensar! para abordar os temas do trabalho escravo contemporâneo e do tráfico de pessoas. A escola recebeu materiais didáticos produzidos pelo programa, apoio financeiro de R$ 1.500,00 e assessoria pedagógica durante todo o desenvolvimento do projeto.

O objetivo da iniciativa foi proporcionar uma leitura crítica da realidade a partir de teatro, música e fotografia. Inicialmente, essas ações foram planejadas para serem desenvolvidas somente no âmbito escolar. No entanto, o projeto cresceu e, graças à dedicação dos alunos, tomou diferentes espaços da cidade e de seu entorno, como, por exemplo, a Fundação Helena Antipoff, que cedeu seu espaço para a realização da culminância.

As ações do projeto

Os temas foram trabalhados em todas as turmas do Ensino Médio, tendo como subsídio os materiais do Escravo, nem pensar! e estudos de casos reais de trabalho escravo e tráfico de pessoas. A partir deles, foram desenvolvidas peças teatrais (1º ano), paródias (2º ano) e fotografias (3º ano). O grande destaque foi a exposição de fotos, que após ser exibida por entidades parceiras do projeto, continua sendo requisitada por outros espaços, como a Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC).

De acordo com a professora Denise, os alunos do 3º ano do Ensino Médio se destacaram. Eles decidiram que não apenas seriam os fotógrafos, como também os personagens a serem fotografados. Isso gerou uma competição saudável entre eles, cujo resultado foi um enorme montante de fotos, cheias de criatividade.

Ao se dar conta do crescimento do projeto e de sua importância para a comunidade, a escola buscou parcerias com outras instituições locais. A principal foi com a Fundação Helena Antipoff (FHA), que conta com escola, oficinas e projetos socioeducativos. Ela cedeu o seu auditório para o evento de culminância do projeto e doou os totens de madeira onde foram expostas as fotos dos alunos. “O que foi para ela [escola] o término, para os nossos alunos foi o início”, ressaltou Maria do Carmo Lara Perpétuo, presidente da fundação, que pretende desenvolver atividades sobre os temas com seus alunos no ano que vem.

A exposição foi exibida primeiramente no no shopping center próximo à escola, o Viashopping, onde foi bastante aclamada pelo público. Em seguida, foi encaminhada à Fundação e, posteriormente, para a escola, onde ganhou uma sala especial. Mas devido a seu sucesso, continua sendo requisitada para estrear em outros espaços,como a Universidade Estadual de Minas Gerais e a Pontifícia Universidade Católica de Mineras Gerais.

“O projeto não é mais nosso, é da sociedade”, disse o diretor. “A gente não sabe medir as consequências. De repente aquela fotografia alertou uma pessoa para uma situação que ela iria passar (…) Isso não dá pra medir e isso é bonito na educação”, completou, emocionado.

ABELA

O projeto sob os olhos da professora

Denise leciona há 29 anos, sendo 23 deles dedicados à Escola Estadual Imperatriz Pimenta. Sempre sorridente, é querida entre os alunos e foi a principal mobilizadora do projeto. “Enquanto professora e educadora, eu considero este tema essencial. Deveria ser trabalho em todas as escolas. Deveria estar, inclusive, na grande curricular”, enfatizou.

Mas ela alega que o começo não foi fácil. Quando iniciou as abordagens, os temas causaram estranheza. “Professora, mas isso [tráfico de pessoas] não existe”, comentou um aluno. Essa opinião era compartilhada por alguns amigos, mas a classe estava dividida. Essa divisão, no entanto, gerou curiosidade nos alunos, que começaram a investigar o tema. “Eles chegaram ao ponto de descobrir que na comunidade tinha um caso de tráfico de pessoa”, recorda a professora.

Como em todo projeto, problemas aconteceram: alguns professores precisaram se desvincular do projeto e houve remanejamento de recursos.  Mas a direção e os professores da escola e a equipe pedagógica e do Escravo, nem pensar! ajudaram a contornar. “Quando a gente vê o final do projeto, a gente vê que é de uma grandeza, mas o trabalho é intenso (…). Hoje a exposição é um sucesso. Isso para nós é motivo de alegria. E a gente se sente feliz de ter conseguido chegar até o final”, disse, com um sorriso tímido.