Escravo, nem pensar! desenvolve projeto de prevenção ao trabalho escravo na Amazônia
A ação é implementada junto à sociedade civil em municípios com alta incidência de trabalho escravo e crimes ambientais relacionados à expansão da fronteira agropecuária e ao garimpo
Em outubro, a Repórter Brasil deu início ao projeto Escravo, nem pensar! de prevenção ao trabalho escravo na Amazônia. A iniciativa é dedicada à formação de representantes de organizações da sociedade civil atuantes no Pará e no Amazonas que desenvolvem ações de defesa dos direitos socioambientais e trabalhistas de comunidades em situação de vulnerabilidade socioeconômica. O objetivo é fortalecer a sua atuação na disseminação de informações sobre o tema do trabalho escravo e no atendimento a trabalhadores suscetíveis a essa prática criminosa.
O projeto conta com a parceria da Comissão Pastoral da Terra, Rede Transdisciplinar da Amazônia, Movimento Xingu Vivo para Sempre, Secretaria de Inspeção do Trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego e Ministério Público do Trabalho. A ação é realizada no âmbito do Programa Hotspot Amazônia Brasileira, do The Freedom Fund, apoiador do projeto. Participam ainda órgãos do poder público ligados à área ambiental, como o ICMbio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade) e entidades locais de defesa de trabalhadores, como a SoDireitos e os sindicatos de trabalhadores rurais de Itupiranga e de São Félix do Xingu. O primeiro módulo formativo ocorreu nos dias 17 a 19 de outubro, em Marabá (PA).
A realização do projeto na região é estratégica para a erradicação do trabalho escravo, uma vez que combina a incidência em regiões com alta concentração de casos, mas também onde o problema ainda segue muito invisibilizado. Historicamente o principal foco de trabalho escravo no Brasil é o Arco do Desmatamento, região em que ocorre a expansão da fronteira agropecuária sobre a floresta amazônica e que abrange os estados do Pará, Amazonas, Maranhão, Tocantins, Mato Grosso, Rondônia e Acre. Os dados apontam para uma relação entre a devastação do bioma e a exploração de trabalhadores na região. Até 2021, 27.813 trabalhadores (48% do total) foram escravizados nos estados da Amazônia Legal, sobretudo em atividades ligadas à pecuária e a lavouras diversas, como cana-de-açúcar, soja e milho.
No Pará, de 1995 a 2022 foram libertadas 13.463 pessoas do trabalho escravo, tornando-o o estado campeão em nº de pessoas submetidas a essa prática. Desde a década de 1990, os registros são concentrados nas regiões sul e sudeste do estado. Nos últimos anos, o rastro da devastação, junto a violações de direitos como o trabalho escravo, segue em direção a municípios como Altamira. Essa dinâmica é impulsionada pela Rodovia Transamazônica (BR-230) que, na região, conecta o sudeste do Pará ao sul do Amazonas. Seguindo a rota da Rodovia Transamazônica para o oeste, o desmatamento se expandiu para além das fronteiras do Pará, cruzando a região do rio Tapajós, onde o garimpo ilegal têm sido frequente.
Já no Amazonas, a marca de devastação da floresta vem se expandindo na região sul, como no entorno de municípios como Humaitá e Manicoré. O cenário da região hoje é de grilagem de terras, a derrubada ilegal da vegetação natural e a expulsão dos povos locais de seus territórios. Tais fatores tornam as comunidades da região, como ribeirinhos e indígenas, ainda vulneráveis ao aliciamento para a exploração laboral, principalmente em atividades agropecuárias, no desmatamento e no garimpo. Apesar da constatação do problema, o trabalho escravo ainda é muito invisibilizado na região: em todo o Amazonas, 474 trabalhadores foram resgatados de 1995 a 2022.
Diante desse cenário, o projeto visa fortalecer a rede de prevenção ao trabalho escravo e de combate a crimes ambientais na região. O processo formativo será composto por três módulos presenciais a serem realizados entre outubro de 2023 e março de 2024.