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Tráfico de pessoas

  1. Existe tráfico de gente?
  2. Qual a finalidade do tráfico de pessoas?
  3. O tráfico de pessoas na lei brasileira
  4. O Brasil na geografia do tráfico de pessoas
  5. Todo migrante foi traficado?
  6. Mitos sobre o tráfico de pessoas

Existe tráfico de gente?

Não é raro pessoas receberem propostas vantajosas e sedutoras para vagas de emprego no exterior: boa remuneração, alojamento garantido e a possibilidade de uma vida nova. Mas, infelizmente, as condições reais podem ser diferentes do que foi anunciado.

Confira o vídeo “Tráfico de Pessoas – Exploração Sexual”, da Pastoral da Mulher Marginalizada:

 

A história de Maria é um caso de tráfico de pessoas. Ela vivia no Brasil em situação de vulnerabilidade socioeconômica, buscando melhores oportunidades de trabalho. Foi enganada com falsas promessas feitas por uma pessoa de sua confiança. Viajou para outro país, em um processo de migração e, quando chegou lá, deparou-se com uma situação de exploração sexual da qual não conseguia fugir, porque sofreu agressões físicas e ameaças constantes. Apesar de conseguir fugir, Maria foi morta.

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O que é tráfico de pessoas?

O tráfico de pessoas é um processo que inclui três etapas: o aliciamento, o deslocamento e a exploração da vítima, que podem acontecer de diversas formas.

Nesse diagrama, as etapas estão divididas. Você terá que completar cada uma delas com as palavras destacadas que aparecem no parágrafo da tela anterior

  • exploração da situação de vulnerabilidade
  • documentos retidos
  • falsas promessas
  • ameaças constantes
  • migração
  • exploração sexual
  • agressões físicas

Tráfico de pessoas

1ª etapa
Aliciamento

Mecanismos:

  • adiantamento
  • fraude

2ª etapa
Deslocamento

Tipos:

  • migração forçada
  • rapto
  • contrabando de migrante

3ª etapa
Exploração

Tipos:

  • ____

Mecanismos:

  • dívida ilegal
  • coação
  • isolamento cultural
  • alojamento
  • comercialização de pessoas

Não é necessário que todos os elementos desse quadro estejam presentes para se configurar um caso de tráfico de pessoas, já que as três etapas podem acontecer de diversas maneiras.

O tráfico de pessoas é considerado crime na legislação brasileira e a sua definição oficial consta no Protocolo de Palermo.

Qual a finalidade do tráfico de pessoas?

O vídeo “Tráfico de Pessoas – Mercado de Gente”, produzido pelo Escravo, nem pensar!, apresenta tipos de exploração que as vítimas do tráfico de pessoas podem sofrer.

 

Como vimos, Carlos foi traficado para ser trabalhador escravo e Joana, para ser explorada sexualmente. No entanto, há também outros tipos de exploração decorrentes do tráfico de pessoas. Veja no diagrama abaixo.

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Tráfico de pessoas para adoção ilegal

A reportagem abaixo, feita pela TV Câmara, conta a história de Charlotte, uma brasileira que ainda bebê foi traficada para a França:

 

A adoção ilegal é uma finalidade do tráfico de pessoas que tem diversos casos no Brasil. A Polícia Federal estima que no final da década de 1980, a cada ano, aproximadamente três mil crianças brasileiras eram vendidas e enviadas ilegalmente para a Europa e o Oriente Médio. De acordo com o Relatório Nacional de Tráfico de Pessoas de 2012, do Escritório sobre Drogas e Crimes da ONU, foram denunciados 57 casos de crianças e adolescentes traficados para adoção ilegal: 16 para outros países e 41, dentro das fronteiras brasileiras.

O tráfico de pessoas na lei brasileira

No Brasil, o tráfico de pessoas é crime. Contudo, no Código Penal, ele está relacionado somente à exploração sexual. Os outros tipos de exploração não são mencionados. Veja na tabela ao seguir.

Artigo Tipo penal Conduta Pena prevista
231 Tráfico de pessoas internacional
  • Promover ou facilitar a entrada, no território nacional, de alguém que nele venha a exercer a prostituição ou outra forma de exploração sexual, ou a saída de alguém que vá exercê-la no estrangeiro.
  • Agenciar, aliciar, comprar a pessoa traficada.
  • Transportar, transferir, alojar a pessoa traficada tendo conhecimento desta condição.
De 3 a 8 anos de reclusão.
231-A Tráfico interno
  • Promover ou facilitar o deslocamento de alguém dentro do território nacional para o exercício da prostituição ou outra forma de exploração sexual.
  • Agenciar, aliciar, comprar a pessoa traficada.
  • Transportar, transferir, alojar a pessoa traficada tendo conhecimento desta condição.
De 2 a 6 anos de reclusão
Fonte: “Guia de referência para a rede de enfrentamento ao tráfico de pessoas no Brasil” (Ministério da Justiça, 2012)

Foto 04 - Trabalhadores

Os dois artigos que tratam sobre o crime de aliciamento de trabalhadores, ainda que não mencionem explicitamente o tráfico de pessoas, também são instrumentos importantes no combate a essa prática criminosa.

O Brasil na geografia do tráfico de pessoas

O Brasil é local de origem, trânsito e destino do tráfico internacional de pessoas. Há ainda os casos de tráfico interno, quando as pessoas são deslocadas dentro dos limites territórios do país para serem exploradas. As rotas destacadas no mapa são apenas algumas das mais conhecidas. Há diversos outros fluxos já identificados, além de outros que surgem ou que permanecem desconhecidos. Veja:

  • Tráfico de trabalhadores brasileiros para o exterior

    Mulheres e homens deixam o Brasil todos os anos para trabalhar em boates na Europa e no Suriname, cientes ou não do trabalho como profissionais do sexo. No final, muitos acabam explorados sexualmente.

  • Tráfico de trabalhadores estrangeiros para o Brasil
    Em 2012 e 2013 houve 15 flagrantes de trabalho escravo em confecções de costura, nos quais 154 trabalhadores foram libertados, a maior parte deles bolivianos, peruanos e paraguaios. Essas ocorrências aconteceram principalmente na cidade de São Paulo (SP). Esses estrangeiros são aliciados em seus países, com boas ofertas de emprego, mas quando chegam aqui, enfrentam jornadas exaustivas e condições insalubres de moradia, além da dívida ilegal.
  • Tráfico de trabalhadores dentro do território brasileiro
    No Brasil, é frequente o tráfico de pessoas interno se dar para a exploração do trabalho escravo contemporâneo. Migrantes que não encontram trabalho em suas regiões são aliciados principalmente para áreas de fronteira agrícola ou para os grandes centros urbanos. Para mais informações, acesse a sessão sobre trabalho escravo desta publicação.



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Maranhão é estado de origem do tráfico de pessoas

Na geografia do tráfico interno, o Pará é o principal destino, como vimos na sessão sobre trabalho escravo, de trabalhadores traficados para o trabalho escravo. Por sua vez, o Maranhão é o principal estado de origem desses trabalhadores explorados.

E isso não acontece por acaso: no Maranhão, uma em cada quatro pessoas vive em extrema pobreza, o pior índice no país, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Se incluirmos também a esperança de vida ao nascer e o acesso à educação escolar, o Maranhão ocupa o penúltimo lugar no raking do Índice de Desenvolvimento Humano (IDHM), perdendo apenas para Alagoas.

A maior parte dos maranhenses que cai no ciclo do trabalho escravo contemporâneo vive na zona rural, em municípios marcados pela falta de oportunidades, como Açailândia, Timbiras, Codó e São Mateus.

 

Todo migrante foi traficado?

Percebemos que o tráfico de pessoas tem grande relação com a migração (clique aqui para acessar a sessão sobre migração desta publicação). Mas é importante não confundirmos essas duas coisas, porque nem todo migrante foi traficado.

Conheça agora duas confusões comuns que envolvem os dois temas:

 

  • Contrabando de migrantes

    contabando_migrante

    Acontece quando os migrantes pagam pessoas que podem fazer com que elas atravessem a fronteira de um país e, assim, ingressem no seu local de destino de forma clandestina e irregular. O exemplo mais conhecido é o dos migrantes latinos que pagam caro por “guias” (os “coiotes”) que os transportam em situação de perigo do México para os Estados Unidos. O contrabando pode ser uma das formas de deslocamento do tráfico de pessoas.

 

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  •  Tráfico de pessoas
    Foto 06
    É um fenômeno mais amplo, que tem como objetivo a exploração de uma pessoa para auferir algum tipo de lucro. Em uma das suas etapas, está previsto o deslocamento do migrante, que pode se dar por meio do contrabando de migrantes, mas também de outra forma.
  •  Direito à migração

    foto 7_direitomigração

    Migrar é um direito humano, que deve ser garantido para todos. As pessoas migrantes se deslocam em busca de algo, como novas oportunidades de emprego ou de estudo, melhores condições de vida, tratamentos de saúde, experiências novas, autonomia em relação aos pais.

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  •  Migração forçada

    Fotos: Angela Peres/Secom

    Quando a pessoa não tem escolha e precisa se mudar para garantir a sobrevivência, dizemos que houve uma migração forçada. Em muitos casos, o migrante pode estar fugindo de situações específicas, como desastres naturais, guerras, fome ou perseguição religiosa, étnica e cultural

 

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Políticas antitráfico x Política antimigratória

Medidas repressivas contra o tráfico de pessoas podem ter consequências nas políticas de migração de um país. Muitos governos compreendem que o combate a esse tipo de crime passa pelo endurecimento das políticas de fronteiras, o que dificulta a entrada de imigrantes. Contudo, essa mesma dificuldade tem duas consequências negativas:

1) A violação do direito à migração por meio da formulação de políticas xenófobas. Isso se dá por meio da formulação de leis que tratam os migrantes como criminosos em potencial ou como vítimas de tráfico, especialmente quando procedem de países pobres.

2) O estímulo ao contrabando de migrantes e ao tráfico de pessoas, porque mesmo quando as fronteiras são fechadas, as populações migrantes não desistem de mudar. Diante disso, os migrantes com dificuldade de obter um visto acabam recorrendo a coiotes com a esperança de acessar o novo mundo a todo o custo ou são mais facilmente ludibriados por aliciadores que fazem parte da rede de tráfico de pessoas, já que costumam apresentar planos infalíveis e propostas de empregos sedutoras.

 

 

Mitos sobre o tráfico de pessoas

O tema do tráfico de pessoas é complexo, e a sua abordagem pode conter afirmações distorcidas. Alguns mitos são frequentes na cobertura jornalística, segundo uma pesquisa feita pela Repórter Brasil.

 

  • 1. Tráfico de pessoas é o recrutamento e o transporte de mulheres para a exploração sexual

    Um relatório publicado em 2009 pelo Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crimes (UNODC) estimou que de cada três vítimas de tráfico de pessoas no mundo, duas são mulheres. E de cada 10 mulheres traficadas, oito são exploradas no mercado do sexo.

    Mas isso não significa que o tráfico de pessoas diga respeito apenas à exploração sexual de mulheres, como já vimos anteriormente. A reportagem da TV NBR deixa claro que existem outras formas de exploração relacionadas ao tráfico de pessoas:

  • 2. Prostituição e exploração sexual são a mesma coisa

    A prostituição é uma profissão reconhecida na Classificação Brasileira das Ocupações (CBO), contudo não é regulamentada. Ou seja, para os maiores de 18 anos a prostituição pode ser uma escolha que não envolva exploração sexual nem outras violações de direitos, desde que o trabalho seja exercido seguindo normas e procedimentos que minimizam a vulnerabilidades da profissão. Veja a explicação de uma profissional do sexo sobre isso, exibido no canal Justiça em Questão, do Tribunal de Justiça de Minas Gerais:

     

    A exploração sexual é a obtenção de lucro por meio da prostituição de outra pessoa. As características de trabalho forçado – como cerceamento da liberdade, servidão por dívida, retenção de documentos e ameaça – podem ou não estar presentes nesse caso. O tráfico internacional é realizado sempre por organizações criminosas e máfias.

  • 3. O tráfico internacional é realizado sempre por organizações criminosas e máfias

    Há grandes máfias e redes criminosas envolvidas com o tráfico de pessoas. Mas, geralmente, o aliciamento é feito por pessoas conhecidas das vítimas, nas quais elas confiam, conforme explica Fernanda dos Anjos, do Ministério da Justiça, para a TV NBR:

  • 4. As vítimas de tráfico possuem um perfil específico, porque têm as mesmas condições socioeconômicas e faixa etária

    As pessoas jovens e em situação de vulnerabilidade socioeconômica correm maior risco de serem exploradas – ou seja, de serem vítimas do tráfico de pessoas. Mas já vimos que, embora de maneira desigual, o tráfico de pessoas faz vítimas em todas as classes sociais, como reforça este trecho do documentário de Rafael de Moraes “Tráfico de pessoas: uma lenda urbana real”:

  • 5. Se a pessoa sabia qual seria o seu trabalho e aceitou, ela não foi vítima de tráfico

    O fato de um trabalhador ou uma trabalhadora saber que qual seria o trabalho e que as condições de trabalho seriam duras (seja no corte da cana ou em uma boate, por exemplo), não é justificativa para sua exploração. O chamado consentimento não transforma a vítima em cúmplice da própria exploração nem atenua o crime cometido pelo aliciador e pelo explorador, conforme revela este trecho do documentário de Rafael de Moraes “Tráfico de pessoas: uma lenda urbana real”: